sábado, 20 de maio de 2023

18 - ETERNAMENTE YU YU HAKUSHO

EPS – 18 RIOS DE SANGUE

Após um ataque surpresa mal sucedido, Ryouma corre rapidamente pelas trilhas entre as fendas da montanha sabendo que Mukuro está em seu encalço. Sua mente está a mil por hora neste momento, tentando colocar os seus pensamentos em ordem para planejar suas próximas ações. Mas ele havia cutucado a onça com vara curta e o menor erro agora poderia ser fatal.

Ryouma deveria se preparar o mais rápido possível para sua chegada, atraí-la para um terreno do qual pudesse tirar vantagem, mas até mesmo isto se mostra uma tarefa extremamente complicada quando se está lidando com alguém de tão grosso calibre quanto Mukuro, visto que já não há mais tempo! Pois quando ele finalmente consegue desaparecer num vale enevoado em meio às montanhas, o céu simplesmente se abre diante da chegada da outrora rainha, que num habilidoso salto, se lança diretamente contra seu alvo como se fosse a queda de um míssil.

– Achou mesmo que poderia se esconder de mim nesta neblina?

Grita enfurecida, aquela que é considerada uma das mais poderosas entidades do mundo das trevas.

Por muito pouco, Mukuro não atinge Ryouma em cheio. E no exato momento em que ela toca o solo, uma gigantesca cadeia de destruição se forma logo abaixo de seus pés, desintegrando diversas rochas, enquanto ergue outras de grande proporção diretamente do subsolo.

Ao mesmo tempo, vapores naturais escaldantes vazam por entre as fendas e são dispersos no ar junto a uma imensa quantidade de poeira. Pouco depois, Mukuro se ergue entre os escombros de sua suntuosa entrada, enquanto Ryouma surge à sua frente com um olhar diabólico, manifestando chamas na palma da sua mão.

A última coisa que Mukuro consegue ouvir antes daquela pequena chama acender-se numa colossal explosão é o seguinte:

– “Isto não é nenhuma neblina. É gás natural inflamável sua idiota.”

A liberação de energia subsequente é simplesmente desastrosa! A paisagem inteira é consumida por chamas e boa parte das rochas é arremessada em direção às nuvens. Parecia até que a própria montanha estava se consumindo integralmente numa descomunal explosão vulcânica.

A pouca vegetação que ainda restava é varrida pelas ondas de pressão e o estrondo resultante ecoa por quilômetros de distância em todo o Makai. Chega a ser impossível exprimir todos os detalhes do cataclismo que se seguiu, e que provocou grandes transformações no ambiente daquela região.

Sendo até difícil de acreditar que alguém pudesse sobreviver àquilo. Mas em meio ao fogo intenso e aos poços de lava formados por rochas derretidas, Ryouma e Mukuro surgem flutuando em pleno ar a apenas alguns metros do chão, enquanto se aniquilam mutuamente em fervorosas sequências de golpes, poderosos e incríveis, rápidos demais para os olhos humanos acompanharem.

Mostrando uma superioridade quase que indiscutível em meio à troca de socos, Mukuro atinge Ryouma fortemente no peito com um chute e este é arremessado violentamente contra a superfície.

Ryouma cai ao solo e é empurrado para trás pela força do golpe por mais alguns metros, mas teima em ser durão o suficiente para manter-se de pé, cambaleando apenas no último minuto, quando, de seus lábios; um pequeno filete de sangue começa a escorrer. Nos momentos seguintes, Ryouma testemunha Mukuro tocar graciosamente o solo com seus pés, como se para ela a velocidade da queda tivesse sido reduzida pelo próprio ar.

Irritado, ele elogia, mas também provoca sua adversária dizendo:

– Maldita bruxa, é muito mais poderosa do que eu imaginava. Mas hoje, você encontrará o seu fim. A quase um século eu estou me preparando para este momento, pois finalmente consegui encontrar uma maneira de te derrotar. Cheguei a pensar que jamais te enfrentaria sozinha, visto que vivia cercada por seus exércitos. Mas aqui estamos, frente a frente ... e será hoje que eu terei a minha vingança!

– Vingança? Eu, por acaso, deveria saber quem você é?

– O quê?! Como se atreve a se esquecer, maldita! No passado, eu fui um rei! Assim como você. Governante da fortaleza de Arindur, até que você tirou tudo de mim.

Não se sentindo surpresa e agindo de maneira arrogante e indiferente, Mukuro lhe diz:

– Um rei? Não, você não é nada. Apenas mais um fraco que estava à frente de algum pequeno país irrelevante ao qual no passado eu massacrei, não é isso? Entenda, não foi pessoal. E como estou de bom humor, eu vou até te dar uma pequena chance para se virar e fugir com o seu rabo entre as pernas de modo a seguir com a sua pobre vida miserável. Mas aproveite, pois esta será a única chance que eu vou lhe dar.

Sentindo que seu coração havia sido despedaçado ao perceber que para Mukuro, ele não era mais do que um desconhecido que noutro tempo fora derrotado e que seu glorioso reino não foi mais do que um pequeno ponto de parada em suas vastas conquistas, Ryouma fica estarrecido com suas palavras e deixa que todo o seu ódio venha à tona e tome conta da situação, ao explodir toda a sua ira em uma mistura de raiva e desgosto ao dizer:

– Meretriz imunda! Vai pagar por tudo o que disse!

Neste momento, Ryouma arranca sua capa que fora parcialmente queimada, saca um Kusarigama e o envolve com a sua energia, demonstrando em seguida grande maestria no uso do conjunto de foice e corrente enquanto brande, gira e arremessa a ferramenta por diversas vezes contra sua adversária.

Mukuro se esquiva por pouco dos ataques, vendo a lâmina passar rente ao seu rosto em alguns momentos, enquanto em outros, vê o peso de chumbo que fica na extremidade da corrente esmigalhar rochas inteiras até que num sagaz movimento com os pés, Ryouma muda a trajetória da corrente e com ela, imobiliza ambos os braços de Mukuro.

Percebendo que numa hábil jogada envolta de sorte ele conseguiu amarrá-la, Ryouma se lança numa veloz e poderosa investida visando decapitar sua inimiga com a sua foice, enquanto traumas de um distante passado deixam Mukuro paralisada, quando ela fita com amargura as correntes em seus braços, lembrando-se dos dias de escravidão que para ela, ainda não foram completamente superados.

No último instante, já quase tardio, Mukuro reage. Erguendo seu braço mecânico para cima, tentando proteger sua cabeça do fulminante impacto. Mas seu braço é completamente despedaçado pela força do golpe, que não só o destrói gerando uma chuva de metais e faíscas, como também arruína a lâmina da foice da Kusarigama, desconectando os diversos elos de sua corrente.

E antes que Ryouma pudesse demonstrar quaisquer reações, Mukuro concentra poderosamente as suas energias na sua mão esquerda e desfere contra seu inimigo uma onda eletromagnética massiva que primeiro atravessa seu corpo causando-lhe a dor de mil facas e que posteriormente, irrompe em direção ao horizonte, deixando um rastro vertiginoso de destruição dimensionalmente distorcida para trás.

Ryouma por sua vez, não é levado pela onda destrutiva, e permanece imóvel no mesmo lugar, sendo eletrocutado e sentindo seu corpo ser milimetricamente retalhado por dentro, enquanto cospe uma quantidade volumosa de sangue.

Extremamente irritada agora, Mukuro observa seu braço parcialmente destruído e definitivamente inutilizado. Fitando seu adversário com furor, ela diz a seu atacante:

– A chance que lhe dei para ir embora ... você deveria ter aproveitado.

Ao que tentando se reerguer, Ryouma espragueja sua adversária mais uma vez:
– Isto não vai acontecer até que eu tenha a sua cabeça em minhas mãos!

Com desdém, Mukuro então provoca seu adversário dizendo:

– Ora, romper essa prótese já foi algo impressionante, que ninguém jamais conseguiu fazer antes, mas não deixe isto lhe subir à cabeça; visto que o erro foi meu. Eu estava distraída. O que te faz pensar que você é capaz de encostar um único dedo em mim? Eu posso sentir a sua energia, e mesmo que você seja um youkai de rank “S”, nem de longe está no mesmo nível que eu, criatura infeliz.

– Não, não estou ... mas o que vai acontecer nós ainda veremos. Há segredos no Makai que até mesmo você desconhece Mukuro. E um deles está bem aqui em minhas mãos.

Neste momento, Ryouma saca de suas costas uma espada de lâmina vermelha, que emana e irradia uma energia negativa e densa, carregada de asco e tristeza que se propagam como sussurros da mais pura aflição por todo o lugar, sendo ouvida com certa angustia por aqueles que estão ali presentes, deixando até mesmo em Mukuro, um sabor amargo na boca.

Ryouma faz em seu antebraço, um corte profundo com ela. Que drena dali e até do chão ao seu redor, boa parte do sangue derramado. O sangue, aquecido pela energia emanada pela lâmina da espada, evapora e é feito de alimento por ela. Em seguida, Ryouma diz a Mukuro:

– Esta é a Onimaru, uma das cinco relíquias Tenka Goken, as melhores espadas que já existiram sob o céu. Cuja lâmina foi irremediavelmente manchada pelo sangue de um Oni, sendo ela, assim, amaldiçoada por seu espírito para sempre. É com ela que eu irei te derrotar.

– Interessante, mas você está errado, eu já ouvi histórias sobre ela. Um poder tão notório assim jamais passaria despercebido por mim. Mas imaginei que esta espada estivesse perdida para sempre. Ou que fosse apenas uma lenda.

– Esta arma magnífica é tão real quanto eu e você, como se dará conta. A lenda diz que essa lâmina mortal é capaz de transpor qualquer coisa, é capaz de superar qualquer poder, é capaz de cortar absolutamente tudo aquilo que estiver em seu caminho. E é capaz de matar inclusive deuses.

– Mas tudo isto ao custo do sangue e do sacrifício daquele que a tiver em mãos. Sim, eu já ouvi todo este blá blá blá muitas vezes antes. Você pensa que nivelou as coisas entre nós, mas isto é uma maldita faca de dois gumes. A lenda diz ainda que seu portador se torna um obcecado pela vingança, e passa a ser atormentado por terríveis pesadelos pelo resto da vida.

– Não importa, os pesadelos vêm em troca do poder. E só serão sanados quando sua lâmina for lavada pelo sangue daquele de quem se busca a vingança. No meu caso … o seu. Há uma alma inquieta e faminta vivendo nesta espada, a alma de um Oni. E eu preciso alimentá-la.

– Então venha logo, só não espere que eu vá facilitar as coisas pra você. Pra mim você não passa de um inseto, um frágil escorpião que rapidamente será esmagado. Eu só preciso evitar o seu ferrão.

– Muito bem, apenas um de nós sairá vivo daqui hoje Mukuro. E você vai descobrir que a diferença de forças que existe entre nós também pode ser contornada. Mas primeiro, há algo que eu preciso fazer.

Sentindo que três presenças igualmente poderosas vinham rapidamente em direção à aquela região, Ryouma estende sua mão esquerda para cima e manifesta suas chamas negras mortais de uma maneira jamais vista antes. Elas se expandem vastamente e criam uma imensa cúpula, uma grande kekkai em torno de si. Logo, o gigantesco domo que manteria Yusuke, Hiei e Darla de fora é avistado por eles, enquanto o mesmo, prenderia Mukuro em seu interior, impedindo-a de fugir.

Em seguida, tomado pelo seu ódio, Ryouma manifesta poderes ainda mais obscuros ao criar, ao redor de si, chamas negras carregadas por uma tenebrosa natureza sombria. Como visto anteriormente, Ryouma manipula as chamas com exímia destreza, e isto mais uma vez se torna evidente quando, em meio ao fogo, vemos surgir à silhueta de um demônio Tentoki portando uma lanterna imperial.

A pavorosa figura do oni nas chamas com uns quatro metros, muito se assemelha à aquela do Ryutoki que vimos antes, porém com menor estatura, havendo ainda um ou outro detalhe diferente, como a presença de chifres ao invés das enormes presas.

E isto faz com que Mukuro cometa um erro ao dizer:
– Isso de novo? Você sabe que não funcionará.

– “Não, desta vez se trata de algo diferente. Estas chamas serão meu alimento e a fonte de sua decadência!” Diz Ryouma enquanto toca com a mão estendida, a lanterna do Oni.

A força da criatura de chamas que havia sido manifestada é desta vez absorvida por Ryouma, que utiliza suas incandescentes energias para amplificar o seu próprio poder, ganhando um aspecto assustadoramente aterrador.

Ryouma passa a irradiar uma força absurda e sua aura queima e desintegra tudo aquilo que ainda restou nas proximidades. Até mesmo Mukuro, antes tão arrogante, agora era capaz de sentir a drástica alteração em seu glorioso poder, dando inconscientemente um pequeno passo para trás, como se estivesse momentaneamente hesitante.

Muito mais forte agora, Ryouma parte velozmente para o ataque e brande sua espada verticalmente de cima para baixo enquanto grita com todo o seu furor:

– CHI NO KAWA! RIOS DE SANGUE!

Mukuro se esquiva mais uma vez por um triz, traçando no chão com os pés uma trilha na poeira do árido terreno enquanto o efeito causado pela espada por si só é devastador! Notamos o momento em que grandes quantidades do sangue de Ryouma são drenados e misturados com as chamas negras, sendo liberadas como uma espécie de extensão da área de alcance de corte de sua própria espada. Um grande feixe de luz, em vermelho e preto, cria uma fissura no espaço dimensional e marca como um afiado corte por alguns instantes o próprio ar.

Vendo que sua adversária escapou, Ryouma muda a direção do ataque ao brandir sua espada mais uma vez, causando outros dois rubros e marcantes talhos no próprio ar, mesmo que não haja nada ali. O efeito visual e a energia emanada pelo ataque davam a certeira afirmação de que Mukuro poderia ser morta por ele se aquele ataque a atingisse.

De alguma maneira, Ryouma conseguia fazer frente a Mukuro agora, ele estava mais forte, mais veloz, mas ao custo de um grande sacrifício. Não poderia manter aquela luta por muito tempo, visto que o que estava sendo sugado era o seu próprio sangue, então precisava acabar com sua inimiga o mais rápido possível. Ele tenta mais uma vez, e mais outra, e enquanto percorrem numa velocidade incrível toda a região dentro da cúpula, Ryouma fica por quase atingi-la por vezes demais.

Há muito tempo Mukuro não sentia tamanha pressão.

Até que em dado momento, Ryouma parece que vai lhe atingir em cheio, mas Mukuro muda de postura, para de fugir e coloca sua melhor carta na mesa quando decide enfrentar frente a frente o tenebroso ataque, ao brandir seu braço esquerdo verticalmente e também cortar as dimensões espaciais do lugar.

Quando ambos os golpes se chocam, distorcem e esfacelam a paisagem ao seu redor, de tal modo que fica permanentemente rompida e congelada no ar. Como se o mundo real estivesse naquele ponto, quebrado, como comumente ocorre a um espelho destruído.

Ambos fitam com atenção por alguns momentos a obra surrealista que criaram, e entendem que não seria seguro sequer encostar naquilo ali. Mas a batalha inegavelmente iria continuar e havia ficado claro que aquele que primeiro atingisse o seu adversário, sairia vencedor.

Neste mesmo instante, Yusuke, Darla e Hiei finalmente conseguem se aproximar do local onde ocorre a tão sangrenta batalha, mas se deparam com uma imensa abóbada de energia que impede a sua passagem. Em seu interior, Mukuro enfrenta o misterioso inimigo e do lado de fora, frustrada, Darla inicia um diálogo com o grupo:

– O que diabos é isso? Um campo de força? Eu nunca vi nada parecido.

– Me parece uma Kekkai.
Diz Kurama, ao chegar ao local e finalmente se reunir com seus amigos.

– “Kurama! Como nos encontrou?” Pergunta Yusuke com grande alegria.

Ao que ele responde:

– Eu apenas segui os recentes rastros de destruição deixados por toda a floresta. Imaginei que vocês pudessem estar envolvidos nisso. O que está acontecendo?

– Alguém nos atacou de repente, e a Mukuro está enfrentando este cara lá dentro agora. Só que daqui não dá para ver nada. A gente precisa dar um jeito de entrar.

Neste momento, Hiei observa a energia negra que envolve a cúpula e passa por eles, dirigindo-se direto para a barreira, enquanto sente uma estranha conexão com ela que lhe paira no ar. Ao que em proximidade com aquela estranha energia, Hiei sente em sua mente o dragão rugir e em seu interior, e o fogo das chamas negras mortais mais uma vez queimar.

Ele se aproxima vagarosamente da estrutura energética e toca com as pontas dos dedos a barreira, quando no mesmo instante, a mandala gravada por Yajima em suas costas brilha intensamente como se quisesse lhe suprimir até que finalmente desaparece, quebrada pela alta intensidade daquele poder. Fazendo com que o braço direito inteiro de Hiei se incendeie mais uma vez quando ele finalmente afirma:

– Eu sinto a energia! Essas, são as chamas negras mortais! Mas como isso é possível?

Espantado, Yusuke lhe diz:

– É sério isso? Quer dizer que quem está lá dentro enfrentando a Mukuro agora também consegue invocar as chamas negras mortais assim como você, Hiei?

Ao que o próprio Hiei, tremendo e olhando pros próprios dedos, lhes diz:
– Não. Vocês não estão sentindo? Esse cara está em um nível muito maior!

Confuso, Urameshi questiona:
– Alguém pode me explicar o que tá acontecendo?

Ao que Kurama apenas muda de fisionomia, fica mais sério diante da situação e se perde em seus próprios pensamentos, pois como bem sabemos, ele é o único ali que sabe exatamente de quem se trata a figura misteriosa que Mukuro está enfrentando.

Aquelas simples palavras proferidas por sua própria boca, parecem despertar grande desprezo em Hiei, que atônito, desfere um violento soco contra a barreira à sua frente, e depois mais um, e posteriormente mais outro. Iniciando assim uma sequência de golpes sem fim que apenas descarregam toda a sua frustração diante daquela barreira impenetrável, enquanto ele diz para si mesmo em sua mente:

– “Não, eu é quem sou o mestre das chamas! Essa maldita barreira vai ter que cair! Vai ter que se curvar à minha vontade!”

Neste momento, as nuvens de cinzas vulcânicas carregadas e eletrificadas, fazem cair um leve chuvisco, que marca aqui e ali o chão de todo o lugar. Enquanto todos são iluminados pelo clarão de breves relâmpagos.

Yusuke testemunha seu amigo repetidamente desferir seus golpes contra a Kekkai, mesmo não obtendo sucesso algum. E já percebendo que há algo mais ali, envolvendo os pesados sentimentos de Hiei, nem estranha quando o mesmo extravasa toda a sua dor gritando em alto e bom tom:

– MAS QUE DROGA!!!

No interior da cúpula, a batalha chega ao clímax máximo quando Ryouma finalmente pensa ter Mukuro encurralada em suas mãos. Ela havia sido levada a um vale cheio de rochas, e uma imensa delas se situava às suas costas. Mas neste ponto, Ryouma encontra-se exausto, ofegante e encharcado pela chuva fina que cai.

Ryouma sabe que não poderá se manter por muito tempo se continuar a usar a Onimaru assim. E ao fitar seu braço, percebe que suas veias estão saltadas e que a espada continua a drená-lo violentamente. Ele então resolve largá-la por alguns momentos, para retomar o fôlego, cravando-a contra o chão rochoso do lugar, alguns centímetros ao seu lado.

Aquela cena parece causar alívio até mesmo em Mukuro, que após ser inegavelmente pressionada por ele, ainda tenta a esta altura manter uma pose altiva. Contudo, o silencioso minuto de descanso entre eles não dura muito. Pois Ryouma logo decide mudar de estratégia ao preparar seu mais magnífico ataque: O dragão das chamas negras mortais!

Tal qual ocorre com Hiei, toda a natureza é sacudida quando as chamas se manifestam. E isto é notado por todos ali presentes. Mas o fluxo de energia invocado aqui parecia ser muito ... muito maior! Até mesmo Mukuro se prepara devidamente para o que enfrentará a seguir.

Quando finalmente é invocada, a criatura demoníaca arde e se incendeia em chamas obscuras, serpenteando no próprio ar enquanto vai em direção à sua oponente, visando consumi-la por inteiro. Por toda a paisagem por onde ele toca, tudo queima e é dizimado, deixando apenas um grande rastro de destruição.

Mas algo que Ryouma não sabe, é que Mukuro já enfrentou este tipo de ataque antes, ela já esteve diante deste mesmo tipo de dragão. E concentrando seus poderes, o corpo de Mukuro simplesmente começa a brilhar de maneira pulsante ao manifestar toda a força da sua youki num único ataque!

– JIGEN RASEN RYU! Fluxo em espiral dimensional!

Ela avança e se movimenta numa velocidade incrível, indo diretamente de encontro ao do ataque supremo de seu adversário. As energias ali manifestadas formam uma espiral a partir de seu punho estendido, e com facilidade, Mukuro atravessa a fabulosa criatura feita de chamas das trevas como se não fosse absolutamente nada.

A alegre expressão no rosto de Ryouma é consumida por terror absoluto quando, além de esfacelar o dragão, Mukuro segue em sua direção e lhe prende na espiral de energia que se formou. Num instante, o braço direito do rei demônio é torcido e dilacerado completamente! E na sequência, ele é arrancado, não se tornando mais do que pedaços de carne e ossos espalhados pelo chão, enquanto são salpicados pelo sangue que se esparge no ar.

Mukuro passa direto por ele, enquanto instintivamente, Ryouma se move pro lado, à esquerda, tentando evitar ao máximo os danos. Mas àquela altura já era tarde demais, ele havia sido desmembrado e grossas secreções de sangue escoavam por seu ferimento, formando uma poça a seus pés.

Mukuro havia mostrado que apesar de Ryouma ser muito forte, a diferença de forças entre eles era abissal. Ainda assim ela demonstra certo grau de espanto ao vê-lo tão rapidamente, cauterizar ali mesmo com sua própria mão esquerda em chamas, o grave ferimento que naquele mesmo instante lhe fora aplicado.

Não muito longe dali Hiei esmurra violentamente a barreira com toda a sua força de vontade e sente quando ela finalmente oscila e começa a desaparecer. Todos ficam agitados e felizes por finalmente atravessarem-na, e seguem em disparada para o campo de batalha.

O dano causado por Mukuro ao youkai parecia ter sido muito maior que o esperado, pois neste momento ela percebe que a kekkai ao seu redor começa a se desfazer. Visto que concentrado apenas em curar seu ferimento naquele momento, Ryouma já não era mais capaz de mantê-la de pé.

Ainda assim, enquanto sua carne queima, e os vapores da cauterização ganham o céu, o rei demônio lhe diz em tom perverso:

– Irá se arrepender por isso bruxa. Irá se arrepender por tudo!

Ryouma caminha a passos vagarosos e cansados, já completamente exaurido e esgotado, até que retoma a sua preciosa espada em suas mãos.

Mas desta vez, em seu braço esquerdo, ele manifesta não energias sombrias como fez outrora, mas sim, pálidas chamas espirituais, luminosamente claras e nunca antes vistas até então pelos olhos de Mukuro.

Chamas muito semelhantes às que Hiei manifestou ao final de sua luta contra Hoozen.

Ele parece exercer um imenso esforço para trazer a este mundo, algo assim tão poderoso e de tamanho resplandecer, que não poderia ser descrito de outro modo, senão compará-las as chamas de sua própria vida sendo consumidas e sacrificadas ali pela chance de um derradeiro ataque.

Seu corpo se ilumina por inteiro, cintila e chega a ganhar certo esplendor ao lidar com tais poderes proibidos, visto que se trata inegavelmente de suas forças vitais. Era como se a sua alma fosse desencarnar do corpo a qualquer momento!

Descarregando naquelas alvas chamas todo o seu asco, e para aplacar sua sede de vingança, ele se dirige grosseiramente à Mukuro dizendo:

– É isto, este será o meu fim, mas também será o seu. Este derradeiro ataque ceifará a minha vida, mas não tenho dúvidas de que finalmente poderá acabar com você, megera! Esta é a técnica suprema que desenvolvi após todos estes anos.

Ryouma deposita todas as suas esperanças neste último golpe, mas se irrita quando percebe que neste jogo de vida ou morte, Mukuro sequer se abala e também não recua. Pelo contrário, ela estava pronta para ele. Pronta para contra atacá-lo no exato momento em que se fizesse o contato físico. A última coisa que ouvimos então é o grito do rei demônio quando ele se lança para a morte dizendo:

– INOCHIRYOKU NO ARU SHIROI HONOO!!! Chamas brancas vitais!

Como se o mundo inteiro se movesse em câmera lenta, Ryouma avança contra Mukuro, mas percebe pelo canto do olho a inesperada chegada de Yusuke e Hiei ao local. Vendo seu filho diante de si, o reconhecimento é praticamente imediato e sua presença ali lhe toca no mais profundo âmago do seu coração.

Num lampejo, ele chega a pensar em toda uma vida perdida e nos momentos que não pôde viver ao lado daquela que ama e dos seus filhos. Ryouma por fim, se distrai e esquece de onde está. Ele fecha seus olhos e … se lança para a morte.

Mukuro por sua vez não perdoa este segundo de distração, gira seu corpo velozmente e golpeia Ryouma ainda no ar antes que a espada lhe toque, ao encaixar um poderoso chute giratório vindo por baixo que o arremessa para longe.

De maneira brusca e repentina, se ergue uma cortina de poeira e de pequenos fragmentos de rocha por onde ele passa, abrindo uma estreita vala no solo até que finalmente ele cai pela beirada de um notável precipício.

Surpreso, ao ver Mukuro sem o braço mecânico e parcialmente machucada, Yusuke lhe questiona: “– Você está bem Mukuro? Quem era aquele cara? Um dos Mazokus?”

– Não, apenas mais um tolo amargurado que eu derrotei no passado buscando a sua própria vingança. Um ninguém, como tantos outros com quem já cruzei. As vezes eles aparecem para me atormentar.

– Que isso?! Não me venha com essa pois não dá para acreditar. O cara parecia ser forte pra dédeu, deu pra sentir de longe a energia dele! E até usava as chamas negras do Hiei.

– Se não acredita em mim, vá você mesmo perguntar a ele.
– Este negócio tá muito estranho. O que você acha Kurama?

Tentando evitar maiores explicações, ele apenas desconversa dizendo:
– Eu sinceramente não sei o que pensar a respeito Yusuke.

Preferindo se abster de maiores complicações naquele momento, Kurama opta por esconder a verdade. Talvez por ter esperanças de que Ryouma se arrependa um dia e consiga criar algum vínculo e laços com seus filhos.

De todo modo, naquele instante, ele decide não contar nada nem mesmo para Hiei, visto que tal qual ocorreu com Ryouma, ele não sabia como o mesmo poderia reagir.

Hiei por outro lado, ignora totalmente a conversa entre eles e passa reto, indo diretamente para a beira do penhasco verificar o status de seu atual inimigo, enquanto transparece grande curiosidade e estranheza.

Para sua surpresa, não havia mais ninguém ali, nenhum sinal do youkai que os havia atacado. Era como se ele tivesse desaparecido no ar. Só haviam rochas e árvores com suas folhas a farfalhar pelo vento.

Visivelmente frustrado, Hiei sente que perdeu uma oportunidade importante ali, apesar de não entender que tipo de sentimento era este que estava experimentando, ou o que afinal estava causando isso.

Após se desinteressar pelo abismo, ele olha diretamente para Mukuro, tentando pescar no ar alguma explicação. Mas ela, que ainda parece guardar certo rancor por suas palavras ao final da batalha em Julon, prefere notavelmente ignorá-lo. Deixando assim uma grande dúvida no ar sobre o quanto ela sabia da verdade.

O grupo então, agora reunido novamente, decide partir, seguindo em sua jornada rumo ao desconhecido. De longe, no topo de uma rocha, Ryouma os observa se afastarem com apatia. Por um momento, ele fita a lâmina rubra de sua espada, e resolve guardá-la de volta na bainha.

Ali, no topo daquela montanha, com suas roupas sendo sopradas pelo vento frio, ele também precisa de um tempo para esfriar a cabeça. Pois ver a imagem de seu filho crescido lhe causou um novo turbilhão de emoções.

E em sua mente, ainda muito abalada pelos últimos acontecimentos, Ryouma finalmente decide por deixar sua vingança de lado, mesmo que isto seja apenas por um tempo.

Pelo menos, até ele pensar melhor no que deve fazer.

Horas depois, em algum lugar do Makai, o grupo de Yusuke segue seu caminho através da floresta até que finalmente eles avistam a vila Effigi, uma grande cidade que cresce em meio ao arvoredo, rodeada por antigas ruínas.

Kurama respira profundamente o ar puro da região e apesar de tantas situações difíceis pelas quais eles passaram e ainda estão vivendo, não consegue esconder um sorriso inundado por boas recordações.

Ele então lhes diz:

– Eu passei um bom tempo da minha vida por aqui.
– Sério mesmo? Então vamos logo pra essa cidade, que agora eu fiquei curioso.

Diz Yusuke encucado. Ao que Kurama frustra suas expectativas dizendo:

– Não, nós não vamos entrar na cidade Yusuke. Quem procuramos, acredito que deve estar morando naquela cabana que está logo ali.

Kurama assim, aponta para uma colina muito próxima a eles onde uma cabana ovalada de madeira se distingue em meio à folhagem. E é para lá que eles rumam.

Já chegando, Darla insiste em dizer:

– Eu jamais conheci uma pessoa tão ignorante na minha vida quanto o Yusuke.
– Ei, o que você está dizendo aí sua fedelha?

– Fedelha não que eu sou bem mais velha que você. Além disso, ao invés da gente passar por tudo isso, nós podíamos estar em Hametsu num minuto se tivéssemos aberto um portal. Mas você é muito cabeça dura.

– E eu lá confio em você sua criaturinha feia!

Por um momento eles ficam se encarando comicamente como se fossem brigar, até que do caminho mais à frente, surgem dois Youkais pacíficos que passam por eles, carregando balaios de agricultor em suas costas e acabam chamando a atenção de Yusuke com uma conversa descabida:

– Você viu toda aquela destruição? Só restou uma cratera imensa!

– Sim, dizem que foi um dos antigos reis quem fez aquilo. Aquele a quem chamam de Yomi. Mas vai por mim, o que ele fez só vai nos trazer mau agouro.

Surpreso, Yusuke se aproxima deles rapidamente e pergunta:
– Ei vocês, este cara de quem estão falando, o Yomi, o que foi que ele fez?

Desconcertado pela abordagem repentina, um deles apenas lhe diz:

– Bem, dizem que Yomi estava treinando com seu filho na região de Anasha e que ele partiu a rocha Chibiki no iwa em mil pedaços! Aquela que todos acreditavam ser inquebrável. A mesma cuja lenda nos conta que selava um caminho entre o Makai e o mundo dos homens desde o princípio dos tempos.

– Não, não, não. Não foi só isso, eu estive lá. Acredite nas minhas palavras, não foi apenas a grande rocha que ele destruiu. Não sobrou absolutamente nada daquele lugar, apenas uma gigantesca cratera que se estende até o horizonte como a vastidão de um abismo!

Completa o outro youkai, que parecia ser mais entendido do assunto.

Yusuke então os deixa, para que sigam seu caminho, enquanto cerra o próprio punho com força. Externando o que sente, ele diz em voz alta para si mesmo:

– Aquele desgraçado do Yomi ainda está treinando. Está ficando cada vez mais forte. Se continuar assim eu nunca vou alcançá-lo. Vou ter de me superar se quiser vencê-lo.

O grupo então se recompõe e continua sua caminhada até a cabana, onde um silêncio muito grande passa a pairar a cada passo. Eles param em frente à porta e Yusuke, como sempre, é o primeiro a se manifestar:

– Eu ainda não entendi Kurama, o que a gente tá fazendo aqui afinal? A impressão que eu tive nos últimos dias é que estamos andando para lá e para cá, meio sem rumo. Tem certeza que Hametsu fica nessa direção?

– Bem Yusuke, como você ainda não confia totalmente na Darla, tive que pensar em uma alternativa pra gente chegar ao destino final da nossa jornada.

– Então me diz aí, o que a gente tá fazendo?

– Eu não sei se você ainda se lembra da explicação do Koenma, mas diferente do mundo humano, o Makai é formado por um universo em camadas. São planos de existência que se sobrepõem como os andares de um prédio gigantesco. E quanto mais profunda for à região em que estivermos, mais sombria e repleta de monstros abomináveis ela será. Tudo o que você viu até agora, desde o início da nossa viagem, faz parte apenas da primeira camada do mundo das trevas, e esta é considerada a mais pacifica também. Aqui, cidades inteiras puderam prosperar e governos centralizaram o seu poder em países. Mas o Makai é verdadeiramente gigantesco e alguns de seus planos de existência podem bem ser do tamanho do seu mundo.

– Não brinca! Então é verdade aquela história da viagem durar mil anos?

– Sim, pois Hametsu fica em uma das regiões mais profundas e misteriosas do mundo das trevas, sendo na verdade, mais conhecida pelas histórias contadas pelos poucos Youkais que realmente estiveram lá. O peso da existência daquele lugar reuniu energias sombrias e criaturas poderosas.

– Então, sem o artefato da menina, como chegaremos a um lugar tão distante assim?
– Bem, pegando um “elevador” ...

Kurama finalmente entra na cabana e é recebido por um Youkai muito magro e disforme, que possui dedos longos e a cabeça totalmente repleta de estrias. Sua pele é enrugada, como se tivesse sido derretida pelo fogo. Ele aparentemente não possui olhos, mas está ciente de tudo o que se passa a sua volta. E com uma voz rouca e serena, a frágil criatura logo se manifesta dizendo:

– Seja bem vindo Youko, mais uma vez chega até mim um velho amigo.
– Olá Darash. Vejo que está vivo e que passa muito bem.

– Este lugar ... é tudo o que você me disse que seria. Encontrei a paz e apenas espero pacientemente o fim dos meus dias. Mas como sei que você não veio até aqui após todos estes anos só para me ver, me questiono em que posso ajudá-lo afinal?

Indo direto ao ponto, Kurama lhe diz sem rodeios:
– Hametsu.

– Há há há. Se me lembro bem, você voltou quase aos pedaços da última vez em que esteve por lá ... séculos se passaram e ainda assim deseja voltar? Pensei que havia desistido de sua antiga jornada. Não há nada lá para você.

– Por favor Darash, apenas mais uma vez. E prometo que deixarei você em paz.

– Humm, difícil acreditar. Apesar de que faz bastante tempo que você não me procura. Tudo bem, afinal tudo é negociável não é mesmo? O que você me trouxe desta vez?

Kurama sorri e retira um pequeno saco com sementes secas de sua mochila e o entrega à bizarra criatura que muito se alegra. Todos os de seu grupo, parecem curiosos, imaginando que se trata de algo especial e proibido. Mas as próximas palavras de Kurama mostram que as coisas mais simples do mundo dos homens, podem ter grande valor aqui, nas profundezas distantes do mundo das trevas:

– Receba como um presente. São sementes de pêssego, vindas diretamente dos jardins de Izanami, também conhecido como Ningenkai.

– Você me mima Youko. Nem sei quanto mais irei viver se comer deste adocicado tipo de veneno, mas não posso desperdiçar algo tão bom assim não é mesmo? Vamos, me ajude a chegar até lá fora que lhe darei o que tanto anseia.

Kurama auxilia o ancião a se arrastar até o lado de fora da cabana onde seus poderes finalmente são revelados. A pele enrugada de sua cabeça se abre num único movimento e revela que ele possui um imenso olho que cobre quase toda a circunferência do seu crânio. Quando olho se revela, o fluxo da realidade inteira ao seu redor estremece naquele momento e se distorce. O espaço tempo à sua frente é dobrado e forma uma gigantesca espiral, onde ao centro, vemos surgir um portal. Um caminho direto que os levará até as profundezas do Makai, ao local onde se encontra Hametsu.

Antes que partam, o ancião avisa:

– Vocês não percebem, mas é um caminho sem volta este que escolheram percorrer. Cuidado para não se perderem, as sombras têm vida e podem se libertar. O mal ali aprisionado, jamais deve tornar a ver a luz do dia.

Ignorando seus avisos, Kurama apenas lhe diz:

– Obrigado pelo conselho velho amigo. O Yusuke é tido a fazer algumas grandes burradas, mas desta vez pode deixar que ele está com a gente. Espero voltar a vê-lo um dia.

– Ei, que conversa é essa?
– Calma, é brincadeira.

Todos os cinco atravessam a distorção e desaparecem em meio ao turbilhão de caos enquanto o portal se fecha lentamente atrás de si. Darash sorri e come as sementes de pêssego como se fossem as coisas mais gostosas que ele já provou. Ainda que um amargo contraste os espere enquanto rumam ao desconhecido.


Fim do episódio.
Eu não conheci o outro mundo por querer!

Eu sei que meu coração, agora dói ...

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